Instantes

26-06-2024

Profundeza da ignorância daquele que é solitário nas mais belas curvas da vida. Homem ingrato pelos mais sublimes presentes de sabedoria interna.

No término de uma linha bilateral a fonte de luz que escolhemos pode determinar o próximo triângulo equilátero que transcende todos aqueles sentimentos de injustiça, de humilhação, de rejeição, de abandono que ardem alquimicamente na Alma e acalma o Ego solitário. Esta é a versão de esperança.

Contudo, a versão cega também existe. É aquela em que semeamos a ignorância mais profunda e continuamos a cavar aquele terreno que acreditamos ser fértil. Mantemo-nos firmes mesmo quando as dores nas costas de tudo o que carregamos nos pedem para parar nesse mesmo instante. Não paramos e escolhemos continuar porque é socialmente correto fazer dessa forma. Não existe outra versão que nos tenham ensinado no seio da família, na escola, no grupo de amigos e vamos sobrevivendo ansiosamente pelo dia em que já não sentimos tudo aquilo que nos perturba. A ditadura individual e social não nos dá permissão para ver a chave que pode abrir a porta da vida em liberdade de escolha.

"És fraco. Não prestas. Mais valia não teres nascidosão falácias que alimentam o medo. O olhar não alcança a fé quando se escolhe viver na escuridão. A coragem precisa de água pura e dourada. São poucos os que conseguem. Sabemos apenas que seremos cada vez mais Homens que vão escolher olhar para dentro de si com amnésia do significado de sobrevivência. A triste notícia é que até esse instante a dor bebe a energia vital e adormece-nos do mundo.

A versão cega é também aquela em que preferimos observar em tons humorísticos a vida do vizinho. Basta uma palavra. Basta caminhar em direção a um campo de batalha já perdido – controlar, manipular, criticar, julgar aquele que só faz asneiras, aquela que não se orienta na vida, aquele que é pedinte na rua, aquela que é prostituta, aquele que traiu a mulher, aquela que dança nos bares de cabaré…

Eu, eu e eu? Estás aí? Homem frustrado. Homem feliz. Homem desamparado. Homem autêntico. Homem fechado. Homem livre.

Sabe-se que o prémio final da vida é igual para os que vivem dentro e fora da lei ética – um caixão escuro de madeira, flores, palavras bonitas, choros entre gargalhadas, memórias, o perdão, um corpo que alimenta os bichos da terra… E curiosamente, sabe-se também que o caminho que se estabelece individualmente vai determinar a paz que sentiremos ao receber aquela recompensa.

A capacidade de aceitar que fizemos o que estava ao nosso alcance para vivermos cada instante com sabedoria interna não é atingível a todos. É para aqueles Homens que arriscam julgarem-se a si mesmos e param de uma vez por todas de registar no seu hipocampo as reações inconscientes que visitam a amígdala quando o olhar que têm sobre o vizinho prevalece sobre aquele que têm sobre si mesmo. É aquele Homem que inicia a jornada do autoconhecimento analisando os seus comportamentos, as suas escolhas, as suas emoções, os seus sentimentos e determina o caminho que define traçar para si desde o instante em que gritou ao seu coração "BASTA! A vida é mais bela que isto e eu estou a escolher desperdiçá-la".

Este Homem precisa de semear todos os dias a capacidade de resiliência desse novo "eu", porque as linhas bilaterais não desapareceram. O que muda é a forma como abraça cada "pancada" emocional que bate à sua porta. O "eu" antigo ainda lá está. Estará lá sempre para relembrar o Homem que nasceu para sobreviver, é mais pragmático, poupa mais energia. O "eu" novo segura com determinação a inchada e cultiva amor, gratidão, aceitação, prosperidade, espirais harmoniosas e a perseverança no conhecimento ilimitado que ainda terá oportunidade de alcançar quando se encontra o triângulo equilátero.

Instantes. Passado. Presente. Futuro. Tudo são instantes nesta breve passagem pela Terra.